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A Palestina ergueu uma embaixada em Brasília. O que isso significa?

Construção é carregada de importância simbólica e representa mais um passo para os que defendem a criação do Estado palestino, a despeito da oposição dos EUA e de Israel

 

A Palestina inaugurou na terça-feira (2) uma Embaixada própria em Brasília. A novidade não seria tão grande se envolvesse qualquer um dos 193 Estados-membros da ONU, mas, nesse caso, a própria existência da Palestina como país é um fato controvertido.

 

Tecnicamente, a condição de "Embaixada" já era reconhecida aqui desde 1998, mas a construção só foi erguida, agora, 18 anos depois, no lote 46 do Setor de Embaixadas Norte da Capital Federal. O terreno havia sido doado pelo governo brasileiro no ano de 2010, como é praxe com a representação de todos os outros países, desde a fundação de Brasília. A obra correu por conta dos palestinos. Em retribuição, o Brasil ganhou um terreno para construir sua embaixada em Ramalá.

 

O governo brasileiro vê na Palestina um Estado desde dezembro de 2010, ao

contrário de Israel e dos EUA. O caso está longe do consenso. A nação não

aparece na lista de “Estados-membros” das Nações Unidas, embora, desde 2011,

apareça como “membro pleno” da Unesco, um dos maiores braços da ONU,

dedicado à educação, ciência e cultura.

 

O Conselho de Segurança - formado por EUA, Reino Unido, França, Rússia e

China - nunca aprovou o reconhecimento do Estado palestino. Mas a

Assembleia Geral, sim. A saída foi declará-lo “Estado-membro observador”,

condição semelhante à do Vaticano. Sua bandeira tremula na sede da ONU,

em Nova York, desde setembro de 2015.

 

Para os que apoiam a causa, é uma conquista histórica. Para os que se opõem, um erro.

 

Disputas simbólicas, consequências reais

 

A inauguração da nova Embaixada Palestina em Brasília é mais um pequeno passo na direção do reconhecimento. Ela não tem efeito real nenhum, mas possui uma grande carga simbólica. E, na diplomacia, a simbologia conta muito. Mais ainda nesse caso, pois cada manifestação a respeito da Palestina traz embutida automaticamente alguma posição implícita sobre Israel.

 

A inauguração da nova sede acontece logo depois de o Brasil ter se desentendido com o governo de Israel no episódio envolvendo a indicação de Dani Dayan para ocupar o cargo de embaixador em Brasília. Dayan é um defensor aguerrido dos assentamentos israelenses construídos em territórios em disputa com os palestinos, posição contrária à do Brasil.

A nomeação dele foi feita no dia 5 de agosto por meio da conta no Twitter do premiê israelense, Binyamin Netanyahu.

Diplomatas que defendem a posição brasileira no episódio dizem que Israel atropelou as regras da diplomacia ao fazer esse anúncio publicamente, antes de consultar o país anfitrião.

 

Assim, a presidente Dilma Rousseff não concedeu a Dayan o chamado “agreement”, formalidade por meio da qual um Estado aceita a indicação de um diplomata para o posto. Diante do impasse, Israel acabou retirando a indicação de Dayan e não voltou a indicar mais ninguém para a vaga, que, desde então, permanece aberta.

 

“A abertura da Embaixada Palestina não é, de fato, nenhuma mudança estrutural, mas não deixa de ser uma ironia reveladora, dada a briga diplomática recente entre Brasil e Israel” diz Cecília Baeza, Professora de Relações Internacionais na FGV-SP

 

Raízes da questão

 

Em 1947, a ONU determinou a criação de um Estado árabe e outro judaico na região hoje disputada por palestinos e israelenses. Na época, Israel aceitou a resolução, mas os países árabes se opuseram a ela.

Em 1948, depois de um conflito entre os dois lados, Israel expandiu militarmente seu domínio na região. Esse movimento se repetiria em 1967, na Guerra dos Seis Dias, quando os israelenses estenderam os limites de sua fronteira sobre territórios reivindicados por países árabes e pelos palestinos.

Apenas 25 anos depois, em 1993, o governo israelense se comprometeria a recuar, parcialmente, aos limites de fronteira pré-1967, nos termos de um processo que ficou conhecido como Acordos de Oslo.

Outras negociações se seguiriam entre as duas partes, em 2000 e em 2007, mas com impasses intransponíveis sobre o retorno de 3,5 milhões de refugiados palestinos a seus locais de origem, a desocupação dos assentamentos construídos sobre terras reivindicadas pelos palestinos, onde hoje vivem mais de 150 mil judeus, e a partilha de Jerusalém, considerada ao mesmo tempo capital de um futuro Estado palestino e capital “eterna e indivisível” de Israel.

 

O que faz de um país um país

 

Não existe uma definição única e oficial sobre o que seja um país, nem um cartório internacional que certifique essa condição, explicou aoNexo a professora de Relações Internacionais da FGV, Cecília Baeza.

 

Esse status depende tanto de elementos concretos, como configuração territorial, símbolos nacionais, corpo administrativo, provimento de serviços públicos vitais e capacidade de exercer o uso da força, quanto de fatores imateriais, como a existência de uma língua, uma cultura e uma história comuns.

 

Palestinos não possuem Forças Armadas regulares

Além disso, uma condição fundamental é o reconhecimento dos demais países. Nesse quesito, pode não haver unanimidade. Alguns países reconhecem, outros não. Na prática, como acontece em outras áreas das relações internacionais, o apoio das potências ocidentais vale muito, especialmente dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.

 

“A Palestina é uma nação. Isso é concreto - tem identidade, símbolos, valores comuns -, mas não é um Estado. Um Estado envolve o controle de alguns aparelhos. O principal deles é o controle do uso da força”, disse ao Nexo o professor de Relações Internacionais da PUC, Reginaldo Nasser.

 

“A Autoridade Palestina tem força policial, mas não tem sequer Forças Armadas, não exerce o monópilo legítimo do uso da força, que é uma característica clássica do Estado. A Palestina, aliás, não tem controle sobre a própria água, sobre recursos vitais, espaço físico, território, embora tenha parlamento, tenha cargos de governo. Então, ela é uma nação, mas não é um país”, completa Nasser.

 

 

Fonte: Nexo, expresso

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